RODEANDO O MUNDO E PASSANDO POR ELE – WILLIAM AZEL COOK



RODEANDO O MUNDO E PASSANDO POR ELE – WILLIAM AZEL COOK
(Through the wildernesses of Brazil: By horse, canoe and float)

CAPÍTULO I
     No dia 9 de Setembro de 1897, despedimo-nos dos nossos bondosos amigos em São Paulo e seguimos pela estrada de ferro para Araguary em Minas Geraes.
      Chegado a Araguary, encontramos alguma difficuldade para arranjar conducção para a capital de Goyaz. Finalmente, porém, ajustámo-nos a uma das grandes tropas empregadas no transporte de mercadorias entre as cidades e villas de Goyaz e Araguary.
    Acompanhando dous amigos, partimos de Araguary adiante da tropa para reunirmo-nos a ella no Porto dos Barreiros no rio Paranahiba, que divide os estados de Goyaz e Minas Geraes.

AS PRIMEIRAS EXPERIENCIAS DA VIDA DO SERTÃO
      Embarcados numa espécie de janga composta de tres ou quatro canôas amarradas juntas, nós, cargas, cargueiros, camaradas e caminhantes, atravessamos esse bello rio em um dia de sabbado; e á noite, experimentámos pela primeira vez o prazer (?) de dormir (?) em uma barraca com o estado de Goyaz por colchão e um couro secco de boi por lençol. Para tornar-se ainda mais interessante a experiência, assaltaram-nos os ventos e as chuvas assolando nossa casa de algodão e obrigando-nos a procurar outro abrigo e a dormir em pé. Como não pudemos conseguir uma rede o leito dos viajantes do sertão, ficamos obrigados a dormir durante todo o mez de Outubro no supramencionado colchão e com o mesmo lençol, que, quando apanhava chuva de dia exhalava catinga de noite e attrahia exércitos de bichos forrageadores. Por esse mesmo tempo começamos a experimentar o sabor das munições de bocca usadas pelos viajantes daquelles sertões – feijão cozido com couro sujo de porco e arroz; e, de vez em quando, para variar, carne secca de boi, meio podre, misturada com arroz.
     Varias vezes trocámos o Livro Divino por ovos de galinha, e uma vez por mel de abelhas. A Biblia mesma diz que a Palavra de Deus é alimento, e que é semelhante ao mel, mas nunca antes tínhamos experimentado esta verdade por este modo.
    O governo de Goyaz está sempre procurando melhorar os caminhos, mas não obstante serem largos, não se prestão á passagem de carros de bois por causa dos morros, pedras e valles feitos pelas enxurradas.

SUBLIMIDADES
         Que bellezas e sublimidades se encontram nos altos sertões! Ás vees o caminho nos conduz ás alturas, e apresenta-nos vastíssimo e magnífico panorama de serras e valles, taboleiros e planícies, campos riquissimose mattas impenetráveis, sulcados de córregos que serpenteiam em sombras eternas, sahindo de quando em vez para dançar alegremente e scintillar á luz do sol; – mattas onde se occultam multidões de variedades de viventes desde o insecto mais insignificante até o tigre real, e onde florescem eternamente os exércitos do reino vegetal; e acima de tudo, o sol no pino derramando oceanos de luz. Não sabemos que pensamentos se apoderam das almas dos outros peregrinos que percorrem essas vastíssimas solidões e presenceiam essas, maravilhas naturaes: Quanto a nós porém, não podemos deixar de lembrar-nos das palavras inspiradas do Psalmo XIX: “Os céus declaram a gloria de Deus e o firmamento annuncia a obra das suas mãos: “E contemplando essas grandezas, adoramos humildemente o Grande Creador cujas obras nos rodeiam.
     Como não podíamos afastar-nos muito da tropa, ficamos um tanto limitado em nosso trabalho no Evangelho, pois não podíamos demorar-nos muito tempo em qualquer logar. Não obstante isto, fomos adiante da tropa tres ou quatro vezes. Deste modo passamos o segundo domingo na Villa de Caldas Novas, onde fomos muito bem recebidos e pregamos o Evangelho a uma boa assistência. Neta Villa ha mananciaes de agua quente, morna e fria, cujas aguas se misturam, e tivemos o prazer de provar todas tres quase no mesmo instante.

O Estandarte. Ano VIII, nº 7. São Paulo-SP, 15 de Fevereiro de 1900, p. 2-3

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