O caso do Dr. Kalley, um médico escocês que foi no último outono preso ilegalmente na Madeira, sob a acusação de “blasfêmia e heresia”, e “incitar apostasia e heresia”, sendo julgado em Lisboa e no Funchal. Em 24 de Fevereiro, o juízo conservador do último lugar citado passou a seguinte sentença: – “Supondo que o súdito britânico, Dr. Kalley, perturbou a ordem pública desta ilha pregando doutrinas opostas à religião desta mesma, como é declarado por testemunhas, e considerando esta pregação um abuso que degenerou em crime. Além do mais, o dito Dr. Kalley, como um Protestante, que é, não deve ser punido por isso, vendo que não existe uma lei para punir a pessoa do acusado pelo ato a ele atribuído. Eu, porém, declaro a acusação dada contra o dito Dr. Kalley irrelevante, e ordeno que ele seja declarado liberado de culpa”. Vencidos na questão religiosa, os perseguidores do Dr. Kalley, assim entendemos, vão instaurar procedimentos contra ele como um perturbador da paz pública. Por outro lado, o Dr. Kalley, por sugestão do Lord Aberdeen, deve peticionar para o Governo de Lisboa, para a compensação da perda de sua renda profissional durante sua prisão ilegal. No curso do inquérito diante do Tribunal da Relação em Lisboa, o promotor público, agindo como assistente contra o Dr. Kalley, deu uma exposição muito lúcida da lei existente de liberdade religiosa em Portugal, a qual ele claramente demonstrou que a supremacia da igreja romana não existe mais, mas que os portugueses em assuntos religiosos desfrutam da mesma liberdade como os ingleses têm em todos os assuntos religiosos. Ele disse: “Não caracterizo a acusação como blasfêmia, nem como heresia, porque este crimes são apenas considerados quando cometidos por seguidores da religião apostólica católico romana, e não por aqueles que, como o apelante, segue uma fé diferente, e, no mais, sendo extra ecclesiam, está longe de qualquer censura civil e eclesiástica. Nem posso classificar no geral como apostasia porque entendo que o crime de apostasia cessou de existir entre nós em virtude do artigo 145 da Carta Constitucional, no qual a ampla liberdade de culto é garantida aos cidadãos portugueses nos seguintes termo: – ‘Ninguém será perseguido por motivos de religião;’ dentro do absoluto termo ‘ninguém’, excluindo toda exceção de pessoas, e a próxima expressão que se segue ‘por motivos de religião’, abraça tudo o que se refere ao credo religioso de cada um; e, se porventura, estes dois cidadãos tivessem apostatado de nossa religião, ainda assim não teriam cometido qualquer crime civil pelo qual devessem ser punidos. Extraído de: Colonial Times, nº 1671, 22 de Outubro de 1844, p. 3/Acervo Digital Biblioteca Nacional da Austrália
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