Direito de consciência: fundamento jurídico da Reforma Protestante, opositor natural do Estado-Juiz

 


A Reforma Protestante é sempre lembrada pelas cinco solas: Somente a fé, Somente a Graça, Somente as Escrituras, Somente Jesus Cristo, Glória somente a Deus. Pouco se fala da influência da Reforma Protestante sobre as ciências jurídicas e, por conseguinte, sobre as constituições dos países mais ricos e poderosos da terra, países estes como os Estados Unidos, Alemanha, Suíça, Reino Unido da Grã-Bretanha e outros que sofreram influência direta e profunda dos princípios de fé e transformações sociais advindas da Reforma Protestante. O princípio jurídico que norteou a Reforma Protestante é o Direito de Consciência. Jean Henry Merle D’Aubginé (1794-1872) ao escrever A História da Reforma do Décimo Sexto Século, a mais popular obra sobre a Reforma, assim classifica o Direito de Consciência: “O Protestantismo coloca o poder da consciência acima do magistrado, e a autoridade da Palavra de Deus acima da igreja visível.” O próprio surgimento do codinome protestante está relacionado à luta pelo Direito de Consciência. O rei Calos V queria validar o Edito de Worms de 1521, que tratava Lutero como um fora da lei. Ele havia dado um salvo conduto (habeas corpus preventivo) para Lutero quando ainda parecia simpatizar com o reformador, mas para prender Lutero ele precisava da validação do Edito de Worms pela Dieta (parlamento alemão). Os cincos reis evangélicos, que eram deputados, compareceram à Dieta de Espira, e aconselharam Lutero a não ir. Assim, em 21 de Fevereiro de 1529 fizeram o seguinte protesto que originou o termo protestante: "Protestamos pelos que se acham presentes... que nós, por nós e pelo nosso povo não consentimos em nada com o decreto que nos é proposto naquilo que é contrário a Deus, à Sua Santa Palavra e ao nosso direito de consciência e à salvação de nossas almas.”A partir deste célebre protesto dos reis evangélicos, dia este em que Lutero não se fazia presente, a fé evangélica ganha o codinome histórico de “Protestante”. Martinho Lutero em sua clássica obra Secular Authority (1523), assim defende e define o Direito de Consciência: “Deus ordenou duas espécies de governo entre os filhos de Adão: – o reino de Deus debaixo de Cristo e o reino do mundo sob o magistrado civil, cada um deles com suas leis e direitos. As leis do reino do mundo não vão além do corpo e dos bens e dos negócios externos. Sobre a alma, porém, o direito pertence só a Deus. Quando o governo do mundo ousa dar leis nos interesses da alma invade o reino de Deus.” (Lessa, Vicente Themudo. Lutero. 5ª edição. Editora Pallas, 1976, p. 186-187). O Direito de Consciência não garante apenas a Liberdade de Crença, mas também garante o direito de descrença, visto que a palavra crer significa apegar-se, o descrente que se apega à descrença como crença também encontra amparo no Direito de Consciência. Também é abrangido pelo Direito de Consciência a Laicidade do Estado, a Liberdade de Pensamento, de Expressão, de Associação e de Imprensa, bem como a imunidade tributária dos locais de culto. Para a doutrina do Direito de Consciência, como disse Oecolampadius (1482-1531): “Ora, em assunto de fé, a Bíblia é nossa Constituição.”

 

Comentários