A chamada dos Carajás

 

Traducção livre dum artigo do sr. F. C. Glass, publicado no “Christian”, de Londres

Ha nove annos, que foi publicado na imprensa um appello em favor dos bravos indios da tribu carajá, tribu essa que habita a região do rio Araguaya, Estado de Goyaz.  Havia nesse tempo uma opportunidade para evangelisar os carajás que, se fosse approveitada, poderia resultar não só  na evangelisação dessa  tribu, como tambem na das 400 tribus de indios que habitam a região do rio Amazonas.

Annos apos annos os factos em relação a esse caso foram apresentados ao povo christão, mas a opportunidade foi negligenciada.  Ultimamente, porém, quando nada mais se esperava, surgiu entre o grupo de senhoras piedosas da Nova Zelandia a Idea de começar a manter um trabalho evangelico entre esses índios. Não tardou que se apresentasse um moço talentoso e dedicado, desejoso de ser o primeiro missionario entre elles.  Esse moço, o rev. E. V. Kingdom, embarcou na Inglaterra no mez de outubro proximo passado, mas foi atacado da terrivel grippe, durante a  viagem, vindo a fallecer em  Lisboa. Esta morte foi um golpe tremendo para as nossas esperanças, mas, como a semente que cae na terra e morre, produz muito fructo, assim cremos que esse lamentavel acontecimento resultará em bençams espirituaes para os carajás.

A tribu de indios acima referida habita uma regiao situada a uma distancia de 400 leguas do litoral. A viagem comprehende quatro dias pela estrada de ferro, tres semanas a cavallo, e  um mez, mais ou menos, a canoa pelo rio abaixo. O viajante atravessa uma parte do paiz onde não ha o mínimo traço de civilisação; onde não ha garantias, e onde o indio é soberano, reconhecendo como unica lei suas proprias tradições, e vivendo da mesma forma como tem vivido os seus antepassados ha 400 annos.

Os costumes dos carajás são primitivos em extremo. As suas unicas armas são a frecha e certos instrumentos feitos de pedra. Elles manejam essas armas com egual habilidade tanto na guerra, como na caça, como em apanhar os peixes do rio que constituem quasi exclusivamente a sua alimentação.

Os unicos utensilios domesticos são cabaças e conchas. Andam inteiramente nús, sem sentirem por isso o minimo acanhamento, e pintam os seus corpos de cores vivas. É um povo sadio, de boa apparencia, e sem a maldição de classe, por outro lado vive como as feras das florestas, cuidando apenas da caça e comida. Esse povo possue uma vaga idéa de espiritos malignos que residem nas florestas, e é, naturalmente, superstioioso.  Não parece haver em seu dialecto palavras que exprimam qualquer das grandes idéas evangelicas. Comtudo, não é um povo idolatra, e está livre das idéas grosseiras e crueis das chamadas raças selvagens.

O escriptor destas linhas tem morado nas povoações desses indios, e brevemente espera visita-las de novo para estudar a situação mais accuradamente e assim ajudar os missionarios que os hão de seguir, si não fôr tarde demais. É possível que a solução do grande problema missionário: Como alcançar as centenas de tribus de índios para o Evangelho? dependa do modo porque, em tempo em que a opportunidade para evangelizar os carajás seja aproveitada.

Ha alguns annos que missionarios jesuitas vêm trabalhando entre os indios bororós, no Estado de Matto Grosso, e agora vem a noticia que os mesmos missionarios estão estendendo a sua esphera de acção até os indios caiapos no alto do Rio dos Mortos, o affluente principal do Araguary.  Os caiapos são vizinhos occidentaes dos carajás. O chefe dos jesuitas é auxiliado por nove padres e setenta indios. Vê-se, portanto, que a situação é bastante critica, exigindo por isso um esforço urgente e energico. Quem estará prompto a tomar o lugar do fallecido rev. Kingdom? Quem serão os pioneiros evangelicos aos Carajás? Somente moços de fé experimentada, de perseverança, promptos a confiar em Deus para “a vida e a respiração e todas as cousas”, poderão servir. Devem ser solteiros, affeitos á vida difficil, praticos, pacientes e sympatbicos. Devem ter boa ouvido para apanhar correctamente os sons, e boa memoria para reter as palavras. Devem ter algum conhecimento do latim, pois terão que enfrentar a construcção da lingua. O escriptor poude apenas compilar um pequeno vocabuiario de cerca de 400 palavras. Finalmente, os missionários para os  carajás, devem estar dispostos a uma vida longe dos comfortos da civilização e a não olharem para traz.

Aqui, pois, apresenta-se o maior campo missionário, nao occupado, que existe no mundo, tendo que o obreiro mais proximo acha-se 150 leguas distante. Esta ôpportunidade aurea de serviço, hoje nos é offerecida, mas póde desapparecer desde que não seja immediata aproveitada.

Extraído de: O Puritano, nº 1001, 1 de Maio de 1919, p. 1-2

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