Dieta de Espira: a origem do termo protestante

 

                        Extraído de: Almanaque do Correio da Manhã, 1946, p. 127

Na Dieta de Worms em 1521, a coragem de Lutero em permanecer fiel à Bíblia e à sua consciência foi o grande destaque. O rei Carlos V queria que o reformador se retratasse de seus escritos, mas Lutero não retrocedeu.

Em Worms, “Lutero apelara para sua consciência, afirmando: Minha consciência está presa à palavra de Deus – disse à Côrte. Não voltarei atrás em ponto algum, porque voltar-se contra a consciência não é honesto, nem sadio. Permanecerei assim e não posso fazê-lo de modo diferente. Deus me ajude. Amém.” (Jornal do Brasil, nº 178, 30 de Outubro de 1967, Caderno Especial, p. 3)

Já em Espira, está o momento histórico que levou a fé evangélica a ser reconhecida pelos séculos como Protestante. Lutero não se fazia presente.

“Em 1529, na Dieta de Espira, os príncipes luteranos protestaram contra toda tirania em assuntos de fé e consciência.” (Blyth Agriculturist, 14 de Novembro de 1930, p. 2)

Assim, em 21 de Fevereiro de 1529 fizeram o seguinte protesto que originou o termo protestante: "Protestamos pelos que se acham presentes... que nós, por nós e pelo nosso povo não consentimos em nada com o decreto que nos é proposto naquilo que é contrário a Deus, à Sua Santa Palavra e ao nosso direito de consciência e à salvação de nossas almas.”

A obra A Cyclopaedia of illustrations of moral and religious truths de John Bayte, 1865, p. 172, publicada em Londres, Inglaterra, assim define Direito de Consciência: “Por isso entende-se que é o direito que um ser humano tem de professar suas próprias opiniões em assuntos de religião, e de adorar a Deus do modo que considerar mais aceitável a Ele. - R. Watson”

Jean Henry Merle D’Aubginé (1794-1872) ao escrever A História da Reforma do Décimo Sexto Século, a mais popular obra sobre a Reforma, assim classifica o Direito de Consciência: “O Protestantismo coloca o poder da consciência acima do magistrado, e a autoridade da Palavra de Deus acima da igreja visível.” 

Martinho Lutero (1483-1546) em sua obra Da Autoridade Secular, escrita em 1523, consagra a defesa do Direito de Consciência desta maneira: “O regime temporal tem leis que apenas abrangem o corpo e os bens e as outras coisas exteriores na terra. Pois sobre a alma Deus não pode e não quer deixar ninguém governar a não ser somente ele. Por conseguinte, se uma autoridade secular se atreve a impor uma lei à alma, aí ela interfere no regime divino, seduzindo e corrompendo as almas.” (Da Autoridade Secular de Martim Lutero, Editora Sinodal, 1979, p. 44)

Sobre o fundamento do Direito de Consciência é que a Reforma Protestante garantiu a separação de Estado e igreja, estabelecendo o estado laico.

Laico não é a ideia simplória de separação entre Estado e igrejas, é algo muito mais profundo. Laico quer dizer que o Estado não pode e não deve interferir nos domínios da consciência, pois sobre a Consciência do homem só Deus tem poder. 

O Direito de Consciência não garante apenas a Liberdade de Crença, mas também garante o direito de descrença, visto que a palavra crer significa apegar-se, o descrente que se apega à descrença como crença também encontra amparo no Direito de Consciência. Também é abrangido pelo Direito de Consciência a Liberdade de Pensamento, de Expressão, de Associação e de Imprensa.

Sendo a Reforma Protestante (1517) um marco na história da humanidade é inegável sua influência sobre o ordenamento jurídico dos países europeus que foram fortemente tocados pelos princípios evangélicos emanados dela. Sendo a assim o Direito de Consciência passa a ser um dos fundamentos constitucionais destes países.

O princípio do Direito de Consciência aparece como princípio fundamental que levou à existência da primeira constituição escrita do mundo, a Constituição dos Estados Unidos que veio à existência em 1787.
Enfim, a influência da fé ousada de Lutero tornou-se atemporal, fazendo com que a Reforma Protestante e o Direito de Consciência exercessem influência até mesmo sobre as ciências jurídicas, além do século em que viveu Martinho Lutero, o homem sobre o qual é lícito dizer que abalou o mundo com sua fé ousada.

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